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O Relógio do meu pai

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                                                                                     Maura Espinheira Avena                                                                      (Dedicado a meu irmão: Antônio Itamar Espinheira Filho) O relógio do meu pai parou  Talvez para que eu pudesse enxergar o presente Tudo é contemplação neste tempo Onde a vida se fez dona da eternidade  O Relógio do meu pai parou No tempo da memória, seus olhos me olham e miram a pintura Enquanto seu corpo se aproxima e se afasta da obra para pousar no tempo do sentir Tudo é criação e renovação, alma e coração  Tempo de abandonar o vazio O relógio do meu pai parou E no grito silencioso das horas desesperadas  Ouço sua voz e o canto do pássaro preto  No tempo da memória  A vida faz todo sentido  

Tia Olti: uma crônica da pandemia

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    Tia Olti era a mais velha dos 10 irmãos da linha paterna, meu pai e minha tia, a que me criou, sendo os últimos na escadinha. Tia Olti morava numa casa pequena, longe dos demais irmãos, num bairro afastado, sendo casada com tio Bernardo, dito ser ruim, mas certamente muito feio. Isso eu lembro. Não teve filhos. Contudo, com certa regularidade, devíamos ir visitá-la em sua casa, pois me recordo dela, casa. Depois que tio Bernardo morreu, tia Olti continuou morando na sua casinha, mas passou a vir em casa: ficava sentada lá no   sofá da sala, sozinha, pois, mesmo sendo solicitadas, minha irmã e eu não tínhamos o que conversar com ela. Além disto, regularmente ela telefonava para nossa casa, onde se travava sempre o seguinte e imutável “diálogo”: - Como vai tudo? - Bem. - E como vão todos? - Bem. - Mas como vai tudo? ... Ela falava com um acento de migrante, que não sei reproduzir, mas que era objeto de chacota, principalmente do meu primo. Porque escrevo est

#resistir para existir #existir para resistir

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  PELA CAPACIDADE DE ASSOMBRO... #resistir para existir #existir para resistir Diana Léia Alencar da Silva Maura Espinheira Avena Rita da cruz Amorim Teresa Cristina Merhy Leal   Há uma noção em Psicologia Social que é muito inspiradora e nos convida e motiva a cultivar a “capacidade de assombro” diante da vida cotidiana e das expressões da questão social. Essa capacidade tem sido sabotada sistematicamente pelo excesso de informação e falta do pensamento crítico reflexivo que, por sua vez, tem gerado a incapacidade de indignação e resistência. Os recortes a seguir são parte do nosso legado às famílias, transformados em um convite à “problematização do óbvio”, caminho que retira o véu que encobre a totalidade dos fatos e fenômenos da realidade, para desnaturalizar as diversas violências cotidianas. Não podemos esquecer este caminho consciente e lúcido, sob pena de correr o risco de instaurarmos de vez o fantasma da indiferença. Somos, inegavelmente, os produtores e respo

Porto mãe

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                                       Cinthia Barreto Santos Souza   Sou Porto ordinário, sou tempo e lugar de chegada ou de partida. Sou eu. Como posso resistir sendo eu lugar de ancoragem? Partiram todas as náuticas. Visto o horizonte e contemplo o movimento natural das embarcações arrastadas pelo vento suave ou não. Procuro um binóculo para não os perder da paisagem. Não há sequer um bote que me salve da soledade. Estão todos a navegar enquanto sou na minha condição de porto. Porto Seguro? Não permito desconfiança sobre a base que cravei, pedra sobre pedra. Estou firme apesar das tempestades ordinárias. Sou chegada, fui partida. Posso destinar e receber. Parece cômico, uma ironia perversa, dizer que fazer partir é o ponto máximo de magnetismo para um porto. Para quem? Tripulantes ou transporto? Para partir ou para chegar, sou porto. Estarei no mesmo lado de onde nunca arredei a pedra angular. Estou fincada, feita mãe que dá o peito como alimento fortificante. Tenho o comand

Cápsula aberta ao tempo

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Disponível em https://cdn.pixabay.com/photo/2018/05/01/11/34/family-3365336_1280.jpg CÁPSULA ABERTA AO TEMPO: CARTAS, CRÔNICAS E NARRATIVAS AUTOETNOGRÁFICAS PARA FAMÍLIAS DO FUTURO Diana Léia Alencar da Silva Sejam bem-vindos (as), navegantes! Em 2022, no curso da trajetória iniciada em 2021, prosseguimos mar adentro para narrar e compartilhar, em uma cápsula aberta ao tempo, os nossos “achados” nas odisseias de encontros e reencontros em família. Cabe esclarecer que cápsulas do tempo são utilizadas geralmente para guardar objetos ou informações para o nosso “eu” da posteridade ou para gerações futuras. Algumas são intencionais, destinadas ou não para serem abertas ou acessadas em uma determinada data futura. A cápsula de metal enterrada, em 2018, por exploradores russos no gelo do Polo Norte e posteriormente encontrada em uma praia irlandesa é um exemplo; outro é a “cápsula do tempo” contendo cartas, fotos, celulares, CDs, pen drives, entre outros, depositados por estudantes c

Percursos e caminhadas nas quatro estações: o experienciar da pandemia

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  PERCURSOS E CAMINHADAS NAS QUATRO ESTAÇÕES: O EXPERIENCIAR DA PANDEMIA Carla Verônica Albuquerque Almeida   Verão de 2019... Adentramos na estação do SOL, dos encontros, das festas... abrimos o coração para os sonhos, como nos convida o Grupo Roupa Nova na “Canção de verão” (1981):  o sol latente nos atrai... É verão Bom sinal Já é tempo De abrir o coração E sonhar [...] Um tempo para sonhar com o Ano Novo, estabelecer metas e renovar as esperanças prenhes a se descortinarem... a serem concretizadas. Mas, eis que alguns desses sonhos foram adiados, postergados; outros... quiçá poderão ser concretizados. Tudo isto porque em um continente distante, um horizonte incógnito de mudanças se desvelava sorrateiramente, ampliando-se em um curto espaço de tempo em todo o planeta, com uma celeridade que desnorteou a humanidade. Uma crise de proporções desenfreadas se instalou e abriu as portas para muitas incertezas, angústias, medos, presentificados cotidianamente frente ao ‘desconhecido’,

Galerias

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                                                                                  Galerias                            Rita Amorim Sou daquelas pessoas que gostam de dar e receber presente, a sensação corpórea que me invade nesses momentos é semelhante. Por isso, costumo ter muito cuidado com os mimos que escolho para presentear alguém, do mesmo modo tenho muito cuidado com os que recebo, às vezes se torna uma questão delicada, pois possuo dificuldade em me desfazer deles, apesar da necessidade, muitas vezes. Isso me levou a criar uma galeria na parede do corredor da minha casa para abrigar muitos desses presentes. Estes contam um pouco da minha história, marcada por viagens, cursos de pintura, de fotografia, de momentos, de amizades...    A insuficiência de grana para aquisição de obras de arte me levou a fazer uma composição com retratos da obra do artista, de cartão postal, de fotografias e outros objetos. Por conta dessa galeria, ganhei um amigo velho. Foi nesse processo de emoldura